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Como funciona o processo de adoção no Brasil?

18 de junho de 2019

Saiba o que você pode e precisa fazer para realizar a adoção de uma criança e de um adolescente.

No final do ano passado, o Presidente Michel Temer sancionou a Lei n° 13.509/2017, que trouxe alterações a diversas legislações quanto ao tema de adoção. Dentre as novidades, destacam-se:

  • os novos prazos e procedimentos para o trâmite dos processos de adoção, menores do que aqueles previstos anteriormente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA);
  • um procedimento mais simplificado para entrega voluntária de crianças e adolescentes à adoção.
  • a nova lei também trouxe alterações às legislações trabalhistas, estendendo aos pais adotantes as mesmas garantias que pais biológicos possuem, por exemplo o direito à licença maternidade, intervalos para amamentação da criança adotada durante a jornada do trabalho e estabilidade no emprego durante o período de adoção provisória.

Com a nova lei, o legislador busca incentivar e agilizar o procedimento de adoção, tornando-o menos burocrático para todos os envolvidos, seja quem pretende adotar ou quem deseja entregar seu filho ou filha à adoção.

No entanto, para que possamos entender melhor estas novidades, precisamos dar uns passos para trás e analisar, ainda que de forma simplificada, o instituto de adoção. O que é adoção e desde quando existe no Brasil? O que diz a Lei brasileira sobre adoção, como funciona o processo? Estes e outros temas serão explorados neste texto.

Como funciona a adoção no Brasil?

Adoção, segundo o ilustre jurista Orlando Gomes, é “o ato jurídico pelo qual se estabelece, independentemente de procriação, o vínculo da filiação.” Em outras palavras, adoção é o procedimento legal no qual uma criança ou um adolescente se tornam filhos de uma pessoa ou de um casal, com os mesmos direitos que um filho biológico tem. No Brasil, a adoção é prevista desde 1828, porém foi só com o Código Civil de 1916 (CC/16) que um procedimento de adoção foi estabelecido.

No entanto, a adoção prevista naquele Código Civil  refletia os costumes da época, sendo bastante conservador e permitindo, por exemplo, que apenas pessoas heterossexuais, casadas e sem filhos biológicos pudessem adotar.

Ao longo dos anos houve mudanças à adoção. Foi com a Constituição Federal de 1988 que o instituto da adoção ganhou as suas atuais feições. O artigo 227, § 6° da Constituição, por exemplo, eliminou qualquer diferença entre filhos biológicos ou adotados, determinando direitos iguais para ambos, com o mesmo direito à filiação. Esse parágrafo parece lógico, mas foi uma mudança importante, visto que, ao romper com o paradigma de que uma família só pode ser constituída mediante casamento, isso aumentou as possibilidades para a adoção.

Por fim, em 1990 entrou em vigor o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), cujos artigos preveem o procedimento de adoção. Posteriormente, em 2009, foi sancionada a Lei 12.010/2009, que trouxe inúmeras inovações à adoção, permitindo, por exemplo: que pessoas solteiras pudessem adotar, desde que sejam no mínimo 16 anos mais velhas que o adotado; bem como criando o conceito de família extensa, isto é, “aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade”.

Além disso, foi estabelecido o Cadastro Nacional De Adoção (CNA), no qual deve constar as crianças aptas à adoção e os pretendentes, evitando a adoção irregular, na qual o casal simplesmente “fica” com a criança e a cria, sem qualquer processo legal ou acompanhamento do Estado.

Processo de adoção: Como é o trâmite no Brasil?

Para adotar no Brasil, o indivíduo ou casal precisa passar por diversas etapas, que estão elencadas a seguir:

1. Procurar a Vara de Infância e Juventude do seu município e saiba quais documentos deve começar a juntar

A idade mínima para se habilitar à adoção é 18 anos, independentemente do estado civil, desde que seja respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e a criança a ser acolhida. Dentre os documentos que você deve providenciar estão: documento de identidade, CPF, certidão de casamento ou nascimento, comprovante de residência, comprovante de rendimentos ou declaração equivalente, atestado ou declaração médica de sanidade física e mental, certidões cível e criminal;

2. Fazer uma petição de inscrição para adoção (no cartório da Vara de Infância)

Para dar início ao processo de adoção, será preciso fazer uma petição de inscrição para adoção (no cartório da Vara de Infância), que pode ser preparada por um defensor público ou advogado particular. Só depois de aprovado, seu nome será habilitado a constar dos cadastros local e nacional de pretendentes à adoção;

3. Curso de preparação psicossocial e jurídica

O(s) pretendente(s) devem obrigatoriamente realizar um curso de preparação psicossocial e jurídica, que dura cerca de 2 meses e tem aulas semanais. Após comprovada a participação no curso, o candidato é submetido à avaliação psicossocial com entrevistas e visita domiciliar feitas pela equipe técnica interprofissional, formada por psicólogos e assistentes sociais. O resultado dessa avaliação será encaminhado ao Ministério Público e ao juiz da Vara de Infância;

4. Sentença do juiz sobre a adoção

A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará sua sentença. Caso o pedido do(s) pretendente(s) for acolhido, o nome deles inserido no CNA, com validade por dois anos no território nacional. Com isso, o(s) pretendente(s) estão automaticamente na fila de adoção do seu estado e aguardará(ão) até aparecer uma criança com o perfil compatível com o perfil fixado pelo(s) pretendente(s), observada a cronologia da habilitação (que deseja uma criança com o mesmo perfil e está a mais tempo na fila de espera terá preferência);

5. Encontrar uma criança ou adolescente com o perfil para a sua família

A Vara de Infância vai avisá-lo que existe uma criança com o perfil compatível ao indicado por você. O histórico de vida da criança é apresentado ao adotante; se houver interesse, ambos são apresentados. A criança também será entrevistada após o encontro e dirá se quer ou não continuar com o processo.

Durante esse estágio de convivência monitorado pela Justiça e pela equipe técnica, é permitido visitar o abrigo onde a criança mora; dar pequenos passeios para que se aproximem e se conheçam melhor. Esqueça a ideia de visitar um abrigo e escolher o seu filho a partir daquelas crianças. Essa prática já não é mais utilizada para evitar que as crianças se sintam como objetos em exposição, sem contar que a maioria delas não está disponível para adoção – muitas delas se encontram em abrigos temporariamente porque seus pais estão em reabilitação de dependências químicas ou por falta de condições financeiras, e, nessas condições, respectivamente, terão sua guarda novamente após o fim do tratamento ou ao conseguir um emprego, por exemplo;

6. Se tudo ocorrer bem, a ação de adoção terá início e haverá a guarda provisória da criança ou adolescente

Se o relacionamento correr bem, a criança é liberada e o pretendente ajuizará a ação de adoção. Ao entrar com o processo, o pretendente receberá a guarda provisória, que terá validade até a conclusão do processo. Nesse momento, a criança passa a morar com a família. A equipe técnica continua fazendo visitas periódicas e apresentará uma avaliação conclusiva;

7. Sentença de adoção e registro da criança ou do adolescente na família 

Por fim, o juiz profere a sentença de adoção e determina a lavratura do novo registro de nascimento, já com o sobrenome da nova família. Existe a possibilidade também de trocar o primeiro nome da criança. Nesse momento, a criança passa a ter todos os direitos de um filho biológico.

Algumas dúvidas que você pode ter quanto à adoção…

Além destas etapas, necessário fazer três observações sobre o processo de adoção no Brasil:

1. Quem pode adotar?

Pessoas solteiras, viúvas ou que vivem em união estável também podem adotar; a adoção por casais homoafetivos ainda não está estabelecida em lei, mas alguns juízes já deram decisões favoráveis a seu respeito.

2. É possível escolher uma criança ou um adolescente para adotar?

Durante a entrevista técnica, o pretendente descreverá o que deseja no perfil da criança ou do adolescente. É possível escolher o sexo, a faixa etária, o estado de saúde, os irmãos etc. Quando a criança tem irmãos, a lei prevê que o grupo não seja separado;

3. É possível ser reprovado no processo de adoção?

Caso seu nome não seja aprovado para adoção, busque saber os motivos. Estilo de vida incompatível com criação de uma criança ou razões equivocadas (para aplacar a solidão; para superar a perda de um ente querido; superar crise conjugal etc.) podem inviabilizar uma adoção. Não se preocupe, você pode se adequar e começar o processo novamente!

Problemas com a adoção no Brasil

Ao contrário do que muitos imaginam, no Brasil não faltam casais ou pessoas que desejam adotar. Pelo contrário, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há 7.158 crianças aptas à adoção e 38 mil pessoas interessadas em adotar.

Por que, então, existe uma diferença tão grande entre crianças aptas à adoção e os pretendentes, que as querem adotar? Segundo o CNJ, o maior empecilho à adoção no Brasil é que o perfil de criança exigido pelos pretendentes – isto é, a idade, cor/raça, saúde – não é compatível com aquele disponível nas instituições de acolhimento. Segundo a Juíza Hélia Viegas, da 1ª Vara da Infância e Juventude de Recife-PE, “A minoria das crianças está no perfil idealizado, ou seja, branca e menor de quatro anos. Se não mudarem as exigências, a adoção pelo CNA vai demorar bastante”. Outro problema verificado pela CNJ é a exigência dos pretendentes de adotar crianças sem irmãos, que também são a minoria.

A adoção no mundo é muito diferente da adoção no Brasil? 

Em grande parte do mundo, as normas de adoção são menos exigentes que as brasileiras. Porém, esta “facilidade” de adoção no exterior não é necessariamente algo bom, uma vez que pobreza, tragédias e guerras acabam por criar um mercado de “exportação” de crianças. Exemplo disso são países do norte e centro da África, regiões afetadas por pobreza e guerra civil, e que exigem pouca burocracia para adotar, aumentando a possibilidade de existir tráfico de crianças e adolescentes, por exemplo.

Também há casos de países como a China, em que a política do filho único acabou por levar centenas de milhares de crianças ao abandono (com mínima chance de serem adotadas por casais chineses), colocadas à disposição para adoção internacional.

Em suma, a maioria dos países possuem normas de adoção menos exigentes e detalhadas que o Brasil, embora todas atribuam ao Judiciário a palavra final. Outra diferença em relação à maioria é que o Brasil proíbe a participação de agências especializadas no processo de adoção. Tais agências existem em outros países e podem ser vantajosas, uma vez que facilitam o trato com os órgãos públicos e toda a burocracia e documentação envolvidas. Porém, tal “agilidade” vem com um preço, sendo frequentes as denúncias de corrupção e mercado negro de crianças ligado à prestação de serviços, de acordo com Campell Law Observer.

Fonte: @politize
Dr. Athos Freitas Fernandes Souza – OAB/MG 176.707
Dr. Giovanni Bittencourt de Souza – OAB/MG 176984
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